terça-feira, 2 de março de 2010

sábado, 28 de Junho de 2008


AO TEU NOME

**********



*

ao teu nome
nada acrescento

apenas
o sentimento
que me permite
tratar-te
por amada

terça-feira, 24 de Junho de 2008


TEJO

____________












Da minha casa, o Tejo parece um tapete verde.
Às vezes, uma fábrica de navios.
São tantos, a partir e a chegar,
que os meus olhos ficam confusos e admirados
de como é possível haver tantos barcos no mar.
A minha admiração é muito maior,
quando me dou conta que o Tejo é um rio.
Sabiam que o Tejo é um rio?
Sim, é um rio, embora por vezes não o pareça,
quando da foz se aproxima,
como é normal num rio.
Gosto muito de rios. Sempre gostei.
Mas acho estranho um rio com tantos navios,
vedetas, petroleiros, corvetas, porta-aviões
e outras coisas assim.
É por essas, e por outras,
que acho o rio da minha aldeia
mais bonito que o Tejo.
E, juro que nunca entendi,
por que raio de razões
o Pessoa não gostava do Tejo.
Afinal, ele nem sequer tinha aldeia!




joaquim alves





quinta-feira, 15 de Maio de 2008


40 POEMAS DO RECANTO DAS LETRAS





"ORIGENS",
Técnica mista e acrílico sobre tela, 81x100 cm
Joaquim Alves, Lisboa,1988






1
RELÍQUIA




por fim
ele disse
teus olhos
de cotovia
é que
me vestem
de alegria




2
MAGIA




de todas as vezes
sempre que a voz
sintonizou a noite
chamaram-lhe
magia
é tudo mentira
sempre foi
e nunca mais será
noite
e magia
roubaram-nos
tudo
tudo
tudo




3
SEGREDO




amanhã
no silêncio
da noite
uma nova
liberdade
vai chegar
é urgente
é preciso
é necessário
para sermos
gente
pessoas
não amanhã
de preferência
hoje




4
POESIA É ARTE




perguntaram-me
por que
não pões
poemas
nas telas
respondi
a poesia
já é
arte




5
ARTE




Arte
não é
o risco
é arriscar
a alma
o coração
o corpo
a mão
arte é viver
profundamente
para além
da normalidade
vigente
arte é ser
não se sabe
muito bem
o quê




6
LOUCURA SEMPRE




ou
se
entra
ou
nunca
se
chega
não
é
não
é
meu
amor é




7
LOUCURA 2




voltei
à neve
ao gelo
ao copo
ao corpo
e
foi
foi
uma
uma
húmida
única
loucura




8
LOUCURA





se
não
fosse
assim
a
vida
tinha-se
perdido




9
IDEAL




o ideal
não existe
mas
quando
existe
um ideal
é preciso
mantê-lo
dar-lhe
água


10
ESPANTO




voltei
ao local
do
costume
e
para espanto meu estavas lá



11
LIMIAR




tudo
começou
num limiar
de esperança
pequenino
trémulo
e cheio
de dúvidas
que deu
frutos




12
INJUSTIÇA




já que tudo o que peço
de tão pequeno
não mereço
vou fazer justiça
com as minhas
fracas mãos
amanhã vou ao mercado
e compro uma espada
à imagem
da que vi
usada
velha
gasta
ferrugenta
e tudo
amanhã
vou matar
a morte




13
PEDIDO




como à noite
não posso falar com o sol
fiz um pedido urgente à lua
tentar pôr ordem na morte
porque é indecente roubar
em dez dias apenas
duas amigas e um amigo
da minha vida
fico à espera de resposta
da senhora dona lua




14
VISÃO




alinhou
os patins
respirou fundo
e lançou-se
quero
experimentar
a beleza
humana
e o anjo
desapareceu




15
LUA




foi
ela
que
ditou
eu
escrevi
vós
não
percebeis
nada
de
mim
foi
ela
que
ditou




16
LOBOS




vivem
em
comunidade
e
assim
se
alimentam
de
acordo
com
a
hierarquia




17
ESTRELA


o gato pardo
que anda
pela minha rua
ia a passar
e passou
vi
uma
estrela
e
disse
esta
é
para ti





18
O INFINITO




o infinito não existe
o infinito é um oito deitado
o infinito é o contrário
do que somos
o infinito é uma estátua
antes do terramoto
o infinito sou eu
teses e mais teses
todas à procura
do infinito



19
BEM RARÍSSIMO




o silêncio
como
a amizade
é
um bem
raríssimo
respondeu
o poeta
e
eu
agradeci
com
o olhar




20
JAZZ TIME




um dia voltaremos
a encontrar-nos
num fado da amália
num samba da elis
num poema de gedeão
num solo de santana
num filme de trufaut
ou talvez em montreux
essa cidadezinha suíça
que é uma referência
de encontros súbitos
isso em montreux
para apresentar-te
os meus amigos
que jazz time
gostam de improvisar
fica combinado
no próximo ano
em montreux
nos encontramos


21


AO POETA DO AMOR E DA LUTA,
ANTÓNIO GOUVEIA
(Na Blogosfera: António Melenas)




já não sou eu
que aqui estou
faltas cá tu
falta-me
um bocadinho
de mim
já não sou eu
que cá estou
continuarei
sim continuarei
a escrever-te
cada vez
mais baixinho
e em tom lento
que a vida
se é caminho
só mesmo
exaltada fica
quando lutamos
com o amor
que revelaste
já não sou eu
que estou
por aqui
faltas cá tu
por inteiro




(Para ouvir textos de António Melenas, na voz de Luís Gaspar,
aceda a:
Standard Podcast [16:20m]: Hide Player | Download
em
http://www.estudioraposa.com/index.php/18/03/2008/
lugar-086-antonio-melenas/
e em:
http://www.estudioraposa.com/index.php/11/01/2008/15


22


SILÊNCIO


o silêncio
dos poetas
como tu
é sempre
branco
alvura
onde
novas
palavras
crescem
des
me
su
ra
da
men
te
até
à
terna
idade
(Ainda, para o António Gouveia.)





23
DE QUE RIO VIESTE



de que rio vieste
tu
para te encontrar
nesta margem
o sonho largo
os olhos inquietos
na boca
o espanto
de
que
nascente
brotaste




24
SENTIDOS




perdi
os óculos
mas
continuei
a sentir
as tuas
duas
mãos
até
de olhos
fechados




25
POESIA





agora
os dias
são
maiores
posso dar-te
mais luz
estender-te
os braços
convidar-te
para jantares
poentes
bonitos
e depois
ficar
a ver-te
a saboreares
docemente
Poesia



26
OS PÁSSAROS


Do
ninho
à
represa
vão
apanham
uma
minhoca
Ao
ninho
regressam


27
MILAGRE





saí
de
casa
entrei
no
quintal
a couve
estava
triste
fiz-lhe
uma
festinha
sorriu




28
GRÃO de AREIA


olha
não
cais
para
os
sonhos
mas
a
sul
vou
colher
um
grão
de
areia
para
ti




29
LITERATURA





abri
o
livro
fechei-o
da
gaveta
tirei
a
palavra
amor





30
PALAVRAS



abri
o
livro
fechei-o
da
gaveta
tirei
a
palavra
amor


31
UMA VEZ






morremos pela boca
morremos pelo coração
morremos pela cabeça
morremos pelo pulmão
morremos aos poucos
morremos de emoção
morremos de repente
morremos a destempo
morremos contra a mão
morremos contra a alma
morremos uma vez só



32
O TEMPO



O relógio
não olha
para mim
eu
pago-lhe
com
a mesma
moeda



33
LÁGRIMAS





des
cul
pa
a
sub
li
ma
ção
eu
es
ta
va
mes
mo
a
cho
rar


34
IDEM





Por vezes
são
as lágrimas
que
nos salvam
coisas simples
que no dizer
do poeta
não passam
de água
e
cloreto
de sódio



35
QUASE





Quase perfeita
a razão do gesto
que não aconteceu.
Quase perfeita
a memória do gosto
que se perdeu.
Quase perfeita
a mão que escreveu
e não rasgou
palavras amargas.
E a doçura ali tão perto:
ali mesmo ao lado.
Metade da alma
partida,
perdida...
Quase perfeita,
a intenção!
***************
in, pucaradojaquim.blogspot.com



36
LE TEMPS QUI PASSE







Tudo passa
disse ele
pois
disse
ela
e não
alcançaram
o último
degrau
azul
que a nuvem
que
passava
levou
consigo
inutilmente



37
A ESCRIVANINHA DO POETA







Sentou-se
levantou-se
deu
três voltas
ao
quarto
crescente
e
voltou
escreveu
desisto
de
entender
este
mundo
tão
pouco
global
. ponto
ponto
final .
. final
ponto
pronto
____


Hoje,
não há estrelas
para ninguém!
Morreu mais um poeta!
Pronto.


38
MUSICAL




cons
truí
mos
a
nossa
casa
sobre
ruí
nas
e
ela
não
veio
abai
xo


@joaquim alves
in "Terra Branca"



39
LADO ESCURO





Regressei
à varanda
estive à
tua espera
e não
te vi
será que
foste
pelo lado
escuro
esta
noite


******************
@joaquim alves in "Poemas à Janela"



40
PERSONALIDADE





Cabeça erguida
voz segura
alma calma
olhar vago
sentir profundo
fingimento
nenhum
levantou-se
disse boa-noite
e saiu
para não mais
voltar
*******************
@joaquim alves in "Poemas à Janela"
.
.
.
.
.
.




quarta-feira, 21 de Novembro de 2007


AMPHORA

Convém revelar
a quem o não saiba
que este texto
tem matura idade
e
culpa minha
nenhuma


Para que conste









Amphora



Encontrámos aqui o vinho, o gelo, o copo, o silêncio,
num lugar ermo de terra feito
e madeira velha por tempo:
o ressuscitar dos nossos sentidos e voz;
A escrita germinando
nos degraus húmidos do resistir.
Não há inverno nem verão. Ninguém fala.
Escuta-se o rumor do vento, se o vento sopra,
o silêncio da casa, da amphora.
E há vinho: natureza fresca.
E há mel, recolhido cuidadosamente no ano anterior.
Encontrámos aqui o vinho, o gelo, o copo, o corpo.
E fizemos amor.
*
Que casa querer depois desta casa?
Que corpo desejar depois do corpo ali?
*
Molhámos os corpos nos riachos
gerados no interior da neve e da montanha,
irmanados naquela mútua recompensa de gurgitares:
nós e as fontes; nós e as pequenas quedas de água,
no verdadeiro silêncio da terra.
*
Não havia memória.
Havia chão.
*
Às vezes, sentávamo-nos nas gotas de orvalho,
suspensas na relva
e revíamo-nos nos espelhos das nuvens dispersas,
vagueando em sonhos.
Adormecíamos, por vezes.
Acordávamos tão leves...
*
O frio não era motivo de abandono.
Habitávamos a casa, as réstias de sol,
a luz matinal coada na limpidez do espaço.
Fazíamos o jogo paciente da aranha tecendo a sua rede.
Seguíamos-lhe os movimentos.
Apreciávamos a lentidão das suas esperas.
Sentíamos pena das suas vítimas.
Como libertá-las, sem quebrarmos os ténues braçosda prisão?
*
Era o equilíbrio natural que absorvíamos.
Amávamos. Conjugados no todo de um ambiente primordial.
E quem somos, para podermos quebrar o sossego da harmonia,
construída em todos os recantos
deste terno e pequeno mundo?
Sentávamo-nos, por vezes, no musgo.
Na frescura da terra semeada de pinheiros.
Viajávamos, depois, aos confins do eco
e nossas vozes regressavam mais quentes.
De amor.
*
E quando a mágoa espreitava
sob um sorriso,
dizias somente:
a noite só vem
quando os olhos se fecham de cansaço.
Antes, é a sempre e repetida loucura
dos encontros sem fim, sem fundo,
no outro lado do mundo.
*
Era a manhã vinha ao nosso encontro.
Em busca de um beijo húmido,
nascido no interior da noite.
Caminhava pela madrugada preguiçosa
e removida das entranhas do desejo.
Amanhecia. Ou eras tu que caminhavas
à procura de um silêncio
envolto em nevoeiro matinal?
*
Respiravas sonhos inteiros
à medida dos teus olhos erguidos
na direcção da luz.
Havia um sol razante no arvoredo.
Um reflexo enorme na tua mão.
E o frio ainda não tinha nascido.
*
Brilhavam auroras nos teus olhos.
Nos teus cabelos batia o vento.
E as searas permaneciam atentas
ao lento declinar da tarde.
Um sentimento natural unia-nos
ao cheiro cinzento da terra.
Como penetrar a penumbra do sol,
sem desperdiçar o tempo da erva?
*
Baixo os olhos à torrente de água que nos liga.
Os teus olhos prendem-se atentos
ao lento declinar da tarde
e espantam-se.
A água não mais é cor de água.
Transporta, num turbilhão de nervos,
nosso sangue,
à procura de repouso
no interior mais fundo da terra.
*
Uníamos o cheiro da terra
ao intenso florir dos nossos olhos,
no espanto natural de termos mãos.





quarta-feira, 31 de Outubro de 2007


QUASE PERFEIÇÃO

Quase


Quase perfeita
a razão do gesto
que não aconteceu.
Quase perfeita
a memória do gosto
que se perdeu.
Quase perfeita
a mão
que escreveu
e não rasgou
palavras amargas.
E a doçura ali tão perto:
ali mesmo ao lado.
Metade da alma
partida,
perdida...
Quase perfeita,
a intenção!


Monte Abraão, 30. outubro. 2007

quarta-feira, 11 de Julho de 2007


EM LOUVOR DO ACASO E DO ESPANTO

Pormenor de foto de telas sobrepostas
por um mero acaso.


(para o Manuel Anastácio, sem acaso.)




O ESPANTO




Há coisas que não deixam de nos espantar.
Não conseguir dormir (vá lá saber-se o seu porquê),
não resistir àquele filme do Alfredo, do François,
do Roman, do Bresson, da Duras e mais mil nomes
que não me ocorrem.
Voltando ao importante, por agora,
há coisas que não deixam de nos enpantar.
Um record mundial em apenas cem metros,
mesmo que seja numa piscina,
ou um 470 português que sabe velejar
como eu não imagino.
Mas voltando ao mais importante do importante,
o espanto é termos mãos
e capacidade para cozer o barro
e fazer viagens a marte e arredores
e querermos mais e mais ainda
sempre como nos fica bem
e acreditar que é possível transformar
este mundo infeliz (fica bem e devemos)
devemos afirmar todos os dias
a humildade de sermos humanos e reais
com capacidade de sonhar pois sonhar
todos os dias
todos os dias
todos os dias
até ao suspiro final.





(Sem nenhum amen, please!)

quarta-feira, 27 de Junho de 2007


GALERIA 1 - ArtBox

IN COMPUTER





velas I


velas II



marina I








terça-feira, 26 de Junho de 2007


ART Box 21






ARTbox 20


ARTbox 18


ARTbox 17


ARTbox 16


ARTbox 15


ARTbox 14


ARTbox 12


ARTbox 11


ARTbox 10


ARTbox 9


ARTbox 8


ARTbox 7




Pormenor de "Les amants",
Acrílico sobre tela, 140x230 cm, 1988



ARTbox 6

Desenho em computador, 1996

ARTbox 5


ARTbox 4


ARTbox 3


ARTbox 2


ARTbox 1


ART BOX



Aqui se inicia a publicação de uma série de trabalhos


do arquivo pessoal, realizados pelo próprio


e, maioritariamente, inéditos.

sábado, 16 de Junho de 2007


ADIVINHEM DE QUEM É

(Excepcionalmente, entra aqui a escrita inglesa. Sem mais comentários.)

(Ó dessa!...)
*********************************************************
ODESSA
Fourteenth of February,
eighteen ninety-nine,
the British ship Veronica was lost without a sign.
Baa baa black sheep, you haven't any wool.
Captain Richardson left himself a lonely wife in Hull.
Cherub, I lost a ship in the Baltic sea.
I'm on an iceberg running free.
Sitting, filing this berg to the shape of a ship;
sailing my way back to your lips.
One passing ship gave word thatyou
have moved out of your old flat,
you love the Vicar more than words can say.
Tell him to praythat I won't melt away
and I'll see your face again.
Odessa, how strong am I?
Odessa, how time goes by.
Treasure, you know the neighbours that live next door,
they haven't got their dog anymore.
Freezing, sailing around in the North Atlantic,
can't seem to leave the sea anymore.
I just can't understand why you just moved to Finland.
You love that Vicar more than words can say.
Ask him to praythat I won't melt away
and I'll see your face again.
Odessa, how strong am I?
Odessa, how time goes by.
Oooh, ooooh....Fourteenth of February,
eighteen ninety-nine,
the British ship Veronica was lost without a sign.
**********************************************
(Acontece. Até aos melhores. Adivinhem quem canta.)

POESIA & MATEMÁTICA NA ANTENA 1




(Após a audição de uma excelente conversa,
made in Antena 1, 15/16 junho 2007)

IRONIA

liberto-me
ganho asas
levanto voo

como se libelinha fosse

paro no lago
busco alimento
sigo em frente

como se selvagem fosse

solto-me
sou livre
assim quero

caio na armadilha

preso fico
tento levantar-me
faltam-me forças

com que então
querias voar
insistem

liberdade frágil
aparente
democracia

viva a câmara
de lisboa


(Inteiramente dedicado à visão de Jorge Nuno Silva
e, por tabela, a João Pedro Neto e José Luís Fachada.)

sábado, 9 de Junho de 2007


ANTES DO DIA

sem título, técnica mista @manus 2007


O CALDO ENTORNADO

Nem imaginado tinha
o que se ia passar
estavam todos acordados
e o telefone não tocou
precisava
de um bom dia inesperado
que não chegou
anda tudo atrasado
não vale a pena lamentar
tanta ausência
provoca esta dimensão
fugir da nossa esfera
recuar com a maré
e se a rocha for mole
viva o mexilhão
recupere o pé
e volte a terra
por sua mão
já agora
junte uns amigos
faça uma cataplana
respire fundo
festeje a vida
encomende uns frangos assados
sirva com piripiri
e batata frita
salada mista de alface
agrião e tomate
não esquecendo a velha cebola
já que a vida tem mais valor
com tempero adequado
nada de truques
pois as magias estão caras
mesmo que o barco meta água
e as velas se agitem
há sempre uma hipótese
de voltar a comer um bife

quarta-feira, 30 de Maio de 2007


NEM MAIO NEM MADURO



NEM MAIO NEM MADURO


já não vale a pena pedir
chuva no nabal sol na eira

já não vale a pena esperar

lá se foram todas as esperanças
todos os sonhos e quimeras vãs
todas as mãos que podiam
fazer regresso às origens

esta manhã em dia de greve
o senhor Mundo morreu
sem deixar descendência

acabou a geração rasca a de oiro
a de prata a ilustre a ilusória
a que não vai vir acabou-se

tudo ó tudo
o que era vaidade
e vento que não passou
nem passar vai

nem em maio já se pode confiar

paciência
que tarde já ontem era

quinta-feira, 24 de Maio de 2007


LIBERDADE DAS PALAVRAS






Já no vento me fui embora
porque esperava
que me parassem
fizessem voltar atrás
e não me fosse embora

não funcionou
a estratégia que era simples
não funcionou

perderam-se as palavras
comunicação desnecessária
para tão milhares de fotogramas
por hora e dia e mês e anos
e séculos

só o espanto fica no segundo

naquele espaço de
não sei que dizer
é demais para mim
não tenho palavras
não tenho palavras

palavras para quê
palavras palavras
leva-as o vento
e para lá das ditas
e concretas palavras
o que resta quando resta
é o mistério de haver
palavras por descobrir
tantas palavras
que
davam
para
ficar
eternamente
a dizer
a escrever
a debitar

sonhos quentes
quimeras vãs
sonetos d'outros tempos
memórias da noite
todas as manhãs

davam
e dão

quando
a gente quer
e elas

deixam

MENSAGEM COM DIRECÇÃO




Ilustrações para o Caderno Primeiro @manus 2006/ pequenos formatos



(Txt. enviado para a Truca do Luís Gaspar,
a propósito de pérolas ouvidas no Estúdio Raposa.)
http://www.estudioraposa.com
http://www.truca.pt


SILÊNCIO DAS ONDAS


(Aqui ficam palavrinhas do silêncio da noite,
em ondas redondas, como as escritas.)



Estive a ouvir os últimos Lugares (53 e 54)
e, também,comentários a vulso.
Gostei de tudo, mas sublinho o Luís Durães
que, ao lado de uma Sofia luminosa,
lhes desejo continuada invasão pelas palavras.


Depois, uma Joana aparece em céu de primavera
e se junta a David, que Santos é também.
Doutro modo escrito,
a "poesia está em tudo o que vive"
e "na luta dos homens"
e "no olhar em frente" (Mário Dionísio).


Este link responde a Luís Pinto:
valorizar um texto com o talento de uma voz,
ou não,
é uma falsa questão.
Já A. Pinto Correia avança no "olhar em frente"
que tanta falta nos faz.


Descartando ou não o filósofo,
a mesma resposta vou usar.
Desta feita,
com a ajuda de Sebastião da Gama,
meu amigo e professor primário,
poeta da Arrábida e arredores.


(Cfr., aqui, o título "Promessa")


Dizia ele que o mais importante
é que nos entendamos,
quer leiamos Cleópatra
quer leiamos Cleopátra!!!


Sobre o Mário e a Cornucópia,
duas palavrinhas.
A Cornucópia existe e os Luíses também!
O Cintra, o Gaspar, o Pinto e o Durães,
entre outros.
Sobre o Mário
(tão esquecidos são
os Mários neste país:
Leiria, Viegas, Botas...)
Dionísio, só tenho a dizer que
nos conhecemos no supermercado.


Sim!
A poesia está em todo o lado.


Por fim, Amora Silvestre.
Que delicioso nome!
Bergmann aplaudiria com todas as mãos.
Eu também.
O melhor do mundo para todos.
Porque a utopia existe
em todos os quadrantes desta infantil
humanidade que ainda ousa usar a guerra
para adiar os seus profundos problemas.


Este último comentário dedico-o aos Mários
e aos Luíses e a todos os Nomes
que assim sentem.

Ponto. abraços.

sábado, 19 de Maio de 2007


CEM ANOS


Pablo Picasso, Demoiselles d'Avignon, 1907* by moma.org
Falta o resto da ficha técnica.





Infelizmente, não posso traduzir para português este título. Fica assim. Aliás, nada mais é preciso. Nem título! O quadro está exilado em New York, desde 1939, no MoMA (The Museum of Modern Art - 11 West 53 Street - NY 10019 - 5497), simplesmente entre a 5ª e a 6ª avenidas. Isto, sim! Isto é uma tela. Merci, mon ami, Pablo!
Mais informações: moma.org







(...) "apenas para sozinho não ficar
como sozinho sim ali a olhar para a parede
opaca com este quadro que nunca muda
de posição nem de cor um quadro
verde mate com uma candeia acesa
um puro e terrível picasso exclamei
alguém me perguntou se eu o conhecia
sim andei com ele na escola conheço-o bem
reconheço-o em cada bocadinho de papel tinta
tela óleo verniz olhares estranhos corpos
de visões loucas e ternas reconheço-o sempre
afiámos os nossos lápis com a mesma faca
fomos companheiros de carteira sinto o espanto
nos seus olhos com muita admiração
fomos amigos foste amigo do picasso
interrogavam-se derretidos de louvores indirectos
fui sim
há problema em ter sido amigo dele
não não não é isso então o que é bem pois
como assim e outra vez ainda
nós também somos teus" (...)


excerto de um texto a publicar mais tarde


quinta-feira, 17 de Maio de 2007


MEMORIES I



S/título. Acrílico sobre papel de parede, 1988 @manus



Lamento interromper esta corrente poética,
mas pedem-me, agora, coisas mais palpáveis.
Do tipo: memórias para os vindouros.
Nunca percebi o que isso é!
Cheira-me sempre a vinho do douro,
ou mais lá de baixo, com caves em Vila Nova
de Gaia, que não é, propriamente, o Porto.
Gosto do Porto. Sempre apoiei as iniciativas
do norte, do sul e do centro.
Gosto do sabor e do corpo de coisas palpáveis.
Não resisti ao desafio.

Aqui fica a primeira impressão.



(SEM TÍTALO)





Em pezinhos de lã
chegou-se à minha beira
e perguntou-me
o que estás aqui a fazer
olhei
eu não estava de facto
a fazer nada
disse-lhe
estou a chorar

mas não vejo lágrimas
nenhumas

pois não
se visses era milagre
e os ministros não fazem milagres

pois não

pois estou aqui
a chorar
para que os ministros
possam fazer milagres

e o menino acrescentou
era disso que suspeitava
mas não chores

foi nesse momento
que me apercebi
que começara a chover

as flores da primavera
sorriram para o menino
que rebolou na relva
para apanhar uma gota
que fugia para são bento
sabes eles sabem
que que que que o sonho
não comanda a vida
finalizou o menino
e eu voltei para casa



quarta-feira, 16 de Maio de 2007


EXISTEM POETAS?


Monotipia em papel reciclado (23x22 cm) @ manus 2007




A FALA ACIMA DOS NOMES
Quando as mãos se unem à volta do homem,
para nomearem cada respiração dos nomes,
fica o movimento interno a dizer palavra-vida.
A sensação vazia vai-se com a noite do silêncio pleno,
respiração suave dos nomes que nos prendem.
A visão e o vislumbre, o rosto e a fala, a voz e o manto
- desmonotonia do espaço suplente e desvirtuado:
memória, resistência, povo.

Conjugação perfeita de esforços unidos
para nova fonte, nova aventura;
a aventura da fala em música nossa
na revolução da vida, dos corpos, das relações,
dos sonhos.

A fala acima dos nomes é vitória do povo,
da suspensa retirada da liberdade oculta;
novo modo de vida, fala de liberdade.
Os escritos estão podres. É necessário ternura.
O conteúdo maravilha-se. Existem poetas!

NÃO DA LUA





Doem-me os olhos
a alma já negra anda
não sei se parta se fique
neste entretanto bicudo
talvez vá talvez fique
ainda não sei o que melhor é
vou ficar por momentos
a escrever esta situação
indecisa e verdadeira
indesejável e não porreira
doem-me os dedos
e eu não queria
preciso deles para amanhã
pintar mais uma tela
desejava tanto
que mais ousassem
só que faralhado tudo está
e ainda dizem que o erro
é que nos ensina
outra forma de afirmar
que é ele que comanda a vida
cá por mim mesmo enganado
esta é imperfeita forma de vida
apesar de algumas juras
e justas queixas do luís
má fortuna dos erros
não nasce do nada de alguém
provavelmente
nem nada disto existe
e mesmo que existisse
resta-nos
a grande capacidade
de dizer não

segunda-feira, 14 de Maio de 2007


DESTINAÇÃO


Pintura em acrílico (65x50 cm) sobre papel @manus 1988



o que seria de nós
sem computers
sem auto-estradas
sem portagens
sem aviões
sem engarrafamentos
sem céu cinzento
sem inferno

o que seria de nós
sem relógios
sem hora de ponta
sem semáforos
sem supermercado
sem multibanco
sem euros
sem petróleo

o que seria de nós
sem a lua
sem o sol
sem bússola
sem andorinhas
sem primavera
sem jogos
sem pimenta

o que seria de nós
sem dor
sem esperas
sem futuro
sem olhos
sem mãos
sem sonho
sem quimeras

o que seria de nós
sem bi
sem carta
sem livros
sem cds
sem ouvidos
sem música
sem cabelos


o que seria de nós
sem nada
sempre à espera
à espera
sempre à procura
à procura da perfeição
de nós

QUINHENTOS


Pintura em acrílico (120X120 cm) sobre tela @manus 1995

Texto para a TRUCA, que continua a ser uma querida,
com quinhentas (imaginem!), sim, 500 edições.
Bem-hajas, sempre, Luís da Truca e da Raposa.
Vale a pena meter o bedelho. Juro!

http://www.truca.pt
http://www.estudioraposa.com/






LUGARES


começar é tudo sim é tudo
é o contrário do sabor a nada
da hesitação a murmúrios mesmo lágrimas

começar é uma aventura
com movimentos sempre infantis
como a vela de um barco que muda
de acordo com o vento
sem nunca esquecer o leme

percebo pouco de navegação
e se assim não fosse e tivesse dinheiro
já tinha comprado um catamaran só para me divertir
sem quaisquer pretensões olímpicas

é por isso que prefiro continuar em terra
onde as sementes dão flores
e os perigos não são menores
em todas e quaisquer esquinas
e cruzamentos

em cada mudança de rumo
há sempre perigo de morte e de vida
acho e penso eu que sou optimista
e até gosto deste sentimento ocidental português

um risco para pisar o limite impossível
e assumir que se pisa
bem sei





quinta-feira, 10 de Maio de 2007


AVISO À NAVEGAÇÃO








Sem título






Nem desconfiava
desta antiga desafinação
inventor fica calado
antes de ser mercador
talvez seja injusto
neste comentário
só que tão queimado
pelo silêncio optei
não quero qualquer vingança
já que disso nada sei
doem-me logo os dentes
de pensar essa hipótese
deixem-me como sou
mesmo em manhãs de nevoeiro
suponho que dom sebastião
não regresse
por uma dor de simples humano
vivam pois devagar
que a pressa é má conselheira
vive numa floresta abandonada
e já lhe fizeram o funeral
só não percebo por que andam ainda
a elogiar a sua sabedoria
devagar é que se pode ser feliz
o contrário é morrer na estrada
cá por mim prefiro a praia
de preferência
a tentar salvar alguém
até porque além das queixas do jorge
só ouvi elogios ao sueste
mergulhamos na fuzeta
e vamos parar a olhão
dispensando tamanho exagero
comemos perceves na salema
e vamos de visita à falésia do infante
um minuto depois
ou apenas ao serão

AS ÁRVORES



&

AS PESSOAS


Nunca o saberei. É difícil adivinhar o que vai na alma do outro.
Somos pessoas vivas. Temos sentimentos. Sentimos frio, medo e fome.
Somos de carne, osso e sangue. Apesar do volume d’água.
Provavelmente, por isso. A água é primordial. O fogo também.
Nunca o saberei. Talvez por tudo isso e outras coisas mais.
Onde se esconde a água, o sonho, o mais profundo mistério da vida?
Não há razão para a esperança. Adivinho-lhe apenas o sentido...
Os tempos que correm não são da nossa natureza. Apresentam-se
calculistas, previstos, enumerados. São da Era do Insensível,
Programada e Operacional. Simplesmente, e em nome da mão,
quando a energia falha, não funciona.
É essa a diferença. A máquina depende da electricidade; o eu-pessoa depende,
apenas e só, da sua própria energia.
Nem destino, nem promessa. Em cada dia que nasce, é a capacidade
de sonhar que comanda a vida. É o querer enorme e magnífico que emerge
do silêncio e marca a identidade dos movimentos.

*
As árvores são seres vivos. Agitam-se, crescem e dão flores, quando é esse
o seu destino, ao ritmo do tempo.
As pessoas crescem, movem-se, ausentam-se, agitam-se e, até, fogem,
de acordo com as circunstâncias.

*
Não há razões para duvidar das pessoas.
Mudam de morada. Esquecem-se de o comunicar.
Sonham o melhor dos mundos.
Esquecem-se de o procurar. E, um dia, morrem.
As árvores, pelo menos, não fogem. Quando morrem, morrem de pé.
E não se nota tanto!

quarta-feira, 9 de Maio de 2007


A PROMESSA

Sebastião da Gama, José Régio e Cristovam Pavia
Um trio de luxo que não se pode rejeitar em lado algum.






O Sonho


Pelo Sonho é que vamos,
comovidos e mudos.
Chegamos? Não chegamos?
Haja ou não haja frutos,
pelo sonho é que vamos.

Basta a fé no que temos.
Basta a esperança naquilo
que talvez não teremos.
Basta que a alma demos,
com a mesma alegria,
ao que desconhecemos
e ao que é do dia-a-dia.

Chegamos? Não chegamos?

- Partimos. Vamos. Somos.


Sebastião da Gama
in " Pelo sonho é que vamos "

O VIOLINO DE GARDEN



Era de infinito que eu estava a falar
afinal o infinito é tão simples como
as preocupações diárias e o pão de azeite
para quem ama a serra de azeitão
mais conhecida por arrábida
é tudo relativo na teoria de eistein
curiosamente também no dia a dia da gente vulgar
é claro que tudo o que está em cima
é semelhante ao que está em baixo
e versa-vice de algum modo de aproxima
mas prefiro o som do violino
que juntamente com o do piano
alegram a vida e a alma
é só experimentar juntá-los
noites após noites e em local adequado
para sonatas e melodias de encantar
como as de alguns criadores sem nome
já que estamos no século do futuro
e o futuro nunca teve nome
vem aí devagarinho
só os homens têm pressa
o futuro nunca é mensurável nunca
mesmo com a agitação dos dias
a inflação e o caderno de contas nacionais
o futuro é o presente melhor
à partida
à chegada revela-se o mesmo de sempre
a corda na garganta
as contas sempre difíceis de manter em dia
e aquela chatice do tempo
ou melhor dizendo da sua falta
é isto a vida dos homens
deixo para uma mulher falar das mulheres
sempre insatisfação
e o infinito a espreitar sempre sobre a nossa cabeça

terça-feira, 8 de Maio de 2007


FIGURA


Já não sei
onde era princípio
e fim
nunca saberei.
Já não sei
como começou.


Do começo do caminho
até ao fim da estrada,
nada saberei.
E voltar atrás
nada resolve.


Vou no vento
na tempestade
da montanha.
Conheço o musgo
e o gelo.
De nada me vale
conhecer.


Estou
onde a vida
se escapa
entre os dedos
E

a visão
da alma
me salva


Perdi-me
e
não
sei
por
quê

terça-feira, 3 de Abril de 2007


AQUI, TERRA DA (RE)CRIAÇÃO

Como estreia, nesta terra de todos, o barro joga bem com recriação
das origens, sustento da alma, raízes, esperança, sonho.
Porventura, paz e pombas.
Têm-me pedido poesia, contos, biografia, ilustrações, pinturas,
crónicas, memórias e não-sei-que-mais... Tudo o que puderes!
OK! Tentarei dar o melhor do pouco e, por vezes, do muito pouco que tenho.
Acima de tudo (e isto não é novidade para quem me conhece), prometo a ironia,
o sarcasmo, o mal-dizer, desta feita em dose maior e por conta própria,
como convém a um ser livre.
Só que esta atitude implica, igualmente, redobrada e atenta responsabilidade.
Pronto, já ultrapassei os limites do sério... Raios de sol me queimem!
Vou, pois, colocar a púcara ao forno que se faz tarde.
Bom dia, pessoal da estiva!!!